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Lê atentamente as palavras

«Lê atentamente as palavras da divina Escritura, de tal modo que elas fecundem a tua mente e encontrem a devida expressão na tua prática quotidiana. Foge dos discursos vãos, de molde a não trilhares o caminho da vacuidade dos pensamentos».

Marcos, o Asceta (século V).

 

Eventualmente, a vivência da oração surge-nos marcada por dificuldades. Como o amor, a oração é uma prática intrinsecamente humana: é difícil orar como é difícil amar, como é difícil ser humano. Pode a nossa experiência de oração ser simples e bela, percorrida pela suavidade do falar e do escutar: se assim for, não estamos longe do caminho do Reino, seguindo o modelo das crianças. Mas a ausência dessa suavidade não significará, necessariamente, um afastamento do mesmo Reino.

Aqui fica uma pequena sugestão prática, para os momentos menos profícuos: procure encontrar a cada dia, na medida das suas possibilidades, uns breves minutos de silêncio, libertos das contingências do obrar, das solicitações do agir, das preocupações do pensar. Nesses breves momentos, tome uma passagem da Escritura e dedique-se a uma leitura muito pausada (as passagens oferecidas pela liturgia do dia serão um excelente apoio, assim como os salmos das horas litúrgicas).

A leitura dessa passagem fornecerá, certamente, uma frase, uma sentença ou uma palavra que ecoará nos lábios, nos ouvidos e na mente de quem lê. Permita que essas palavras lhe toquem. Não se preocupe (proponho-lhe até que evite!) em elaborar uma mensagem, uma reflexão ou um propósito: procure apenas a atenção no ler e escutar as palavras divinas (o que já será uma tarefa árdua!). E foque-se, nesses minutos, a repetir, de modo silencioso e pausado, essas palavras que lhe tocaram. Conclua com uma breve prece ou com a repetição de uma fórmula de oração que lhe seja querida.

Proponho-lhe um breve exemplo. A liturgia, no II Domingo da Quaresma, que recentemente celebrámos, propôs a leitura de uma passagem da Epístola de São Paulo aos Romanos. Nesta passagem encontramos esta sentença marcante, capaz de, pela sua força expressiva, interromper o curso das nossas palavras e dos nossos pensamentos:

Se Deus está por nós, quem estará contra nós?

Um caminho de vida cristã iniciará o crente no aprofundar deste favor de Deus. A oração pessoal caminha a par e passo com a conversão contínua. Ao escutar e repetir Se Deus está por nós…, facilmente o significado recairá num Se Deus está por mim…. O pecado fará encerrar esta frase num egoísmo violento. Mas, numa mente renovada segundo os critérios do Espírito Santo, o crente poderá repetir, sem temer, a grande proclamação de Paulo: Se Deus está por nós, quem estará contra nós? São incontáveis os dons que o Espírito fará emergir na alma daquele que reza através destas palavras, divinamente inspiradas e divinamente escutadas.

Texto: Rui Pedro Vasconcelos

Fotografia: Varanasi, Índia, nas margens do rio Ganges

© Giulio Di Sturco. 2nd Place, Series, LensCulture Exposure Awards 2018 – www.lensculture.com

 

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