“Eu sou o meu coração, porque é ele que me distingue, que me molda na minha identidade espiritual e que me põe em comunhão com as outras pessoas”. (Papa Francisco)1
O Apóstolo Paulo escreve aos cristãos de Filipos: “Tende os mesmos sentimentos de Cristo Jesus” (Fl 2, 5). Numa tentativa de síntese, este é precisamente o convite que nos faz “O Caminho do Coração”, o itinerário espiritual da Rede Mundial de Oração do Papa, que nos ajuda a acolher os sentimentos de Cristo em nós e a reagir diante da realidade segundo as coordenadas do Coração do Senhor, em vista da missão.
Detenhamo-nos em dois aspetos deste convite. Primeiro, a expressão “o mesmo” convida-nos a identificarmo-nos plenamente com a dinâmica desse coração, com o seu modo de sentir e de agir. Segundo, “os sentimentos” que habitam o coração, dando-lhe identidade e definindo o núcleo distintivo da pessoa. É um convite a configurar o nosso coração com o coração de Jesus.
“É no coração que se decide tudo”2 já que “aí conta o que somos”3. Por isso, sintonizar com o Coração do Senhor e aprender dos seus sentimentos é estar em sintonia com a própria pessoa de Cristo. “Em última análise, poder-se-ia dizer que eu sou o meu coração, porque é ele que me distingue, que me molda na minha identidade espiritual e que me põe em comunhão com as outras pessoas”4, já que “tudo está unificado no coração, que pode ser a sede do amor com todas as suas componentes espirituais, psíquicas e também físicas”5. “O Caminho do Coração” torna-se, assim, um caminho de encontro com a pessoa de Cristo, de Coração a coração, para nos deixarmos moldar por Ele e abrirmo-nos a colaborar na sua missão de compaixão. “A devoção ao Coração de Jesus é marcadamente cristológica; é uma contemplação direta de Cristo que convida à união com Ele”6.
A disponibilidade para a missão, o desejo de colaborar com Cristo no mundo segundo o seu estilo, nasce do coração compassivo de quem sente o mundo a partir das profundezas de Jesus, desde o próprio centro do seu Coração, tornando-nos sensíveis às dores do mundo e disponíveis para nos comprometermos com elas. Por isso, a disponibilidade apostólica é, antes de mais, uma disposição interior para acolher os sentimentos de Jesus e forjar em nós o seu estilo de vida para atuar no mundo, é uma atitude do coração.
Como é que nos dispomos a acolher esta graça? Passando tempo com Jesus no Evangelho, onde Ele nos mostra com a sua vida o que habita o seu Coração e define a sua maneira de agir. “O modo como nos ama é algo que Cristo não quis explicar-nos exaustivamente. Mostra-o nos seus gestos. Observando-o, podemos descobrir como trata cada um de nós, mesmo que nos custe perceber isso. Procuremos, pois, onde a nossa fé pode reconhecê-lo: no Evangelho”7.
Estar com Jesus, rezar com o Evangelho, dialogar com Ele “como um amigo fala a outro”8.
Este itinerário espiritual é percorrido “escutando” como a Vida do Senhor, manifestada no Evangelho, fala à nossa vida real, e como a vida real se torna Evangelho vivo e atual. “O Caminho do Coração” ajuda-nos a rezar na vida real, porque Jesus “consegue sempre uma maneira para se manifestar na tua vida, para que tu o possas encontrar”9.
E neste caminho vamos deixando que a nossa vida seja transformada pelo Coração do Senhor, que abre um caminho no nosso. “O Coração de Cristo, que simboliza o centro pessoal de onde brota o seu amor por nós, é o núcleo vivo do primeiro anúncio. Ali se encontra a origem da nossa fé, a fonte que mantém vivas as convicções cristãs”10 e de onde este caminho começa e termina.
1 Papa Francisco, Carta Encíclica Dilexit nos, sobre o amor humano e divino do Coração de Jesus, outubro de 2024, n. 14.
2 Dilexit nos, n. 6.
3 Ibidem.
4 Dilexit nos, n. 14.
5 Dilexit nos, n. 21.
6 Dilexit nos, n. 70.
7 Dilexit nos, n. 33.
8 Inácio de Loiola, Exercícios Espirituais, n. 54.
9 Dilexit nos, n. 38.
10 Dilexit nos, n. 32.
Bettina Raed | Vice-diretora internacional da Rede Mundial de Oração do Papa
(In Mensageiro do Coração de Jesus, janeiro de 2025)