1.Respira-se qualquer coisa no ar que respiramos, e não me cheira a coisa boa. Que outra coisa pode ser senão degradação quando leio que naquele aeroporto circula tráfico de crianças? Quando vejo ou ouço na comunicação social Homem em prisão preventiva por cobrar dinheiro a prostitutas, Homem detido por abuso sexual de crianças e gravar os atos sexuais, Homem detido por perseguir ex-mulher e ameaçá-la de morte, Mãe envenena filho pelo incómodo que criava na sua relação extraconjugal, Mãe e filha assassinam cinco familiares (aparentemente devido a culto satânico) ou Detidos quatro suspeitos de furtar veículos para vender as peças (podia continuar, citando), que é isto senão degradação humana?
O meu pensamento vai para as cidades de Sodoma e Gomorra que, segundo o livro do Génesis (Gen 19, 24) ficaram a cheirar ao fogo e enxofre que as destruiu, e onde nem faltaram as aves de rapina em busca do festim (Gen 15, 11) da podridão de vidas em decomposição. Curioso que Santo Inácio de Loyola, no seu livro dos Exercícios Espirituais, fale de fumo, enxofre, sentina e podridão (EE. 68). E ainda mais curioso que seja uma citação tirada da chamada Meditação do Inferno (EE. 65-71). O tal inferno que Sartre dizia serem os outros; o tal inferno que transforma tantas vidas em verdadeiros infernos.
Hoje, fala-se muito de corrupção entre a política e o mundo dos negócios, mas em abono da verdade, já o mesmo livro do Génesis, no seu capítulo sexto, falara da Corrupção (moral) da Humanidade a que Deus não ficara indiferente, ao ponto de, com o coração amargurado, como que se arrepender de ter criado o homem sobre a terra (Gen 6, 5-8). Deus não ficara indiferente como não desistiu, nem desiste. O Dilúvio fora a solução encontrada, não sem muitas vidas perdidas, para levar a história por diante, agora por intermédio de Noé.
2. A sociedade está doente. Na casa do publicano Mateus encontro o Senhor Jesus sentado à sua mesa com publicanos e pecadores, para grande escândalo dos fariseus. Sentiu-Se bem ali, porque para estes foi enviado: Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os doentes (Mt 9, 12). Aqui o Dilúvio (que lava) chama-se Misericórdia (que cura). Que cura Zaqueu da ganância (outro publicano) que enriqueceu, desmesuradamente, explorando os seus concidadãos em proveito próprio.
Os Fariseus tinham, contudo, razão ao acusá-Lo de andar em más companhias (Jesus em Más Companhias é título de livro do autor alemão Adolf Holl). Pagou o preço (e que preço!) ao ser precisamente crucificado entre dois ladrões. Acusaram-No de quase tudo; de corrupção, porém, nunca (pelo menos que se saiba). Viveu entre os pobres, os cansados, os aleijados, os leprosos e gente do género. Os que a sociedade deixara e continua a deixar excluídos à beira do caminho. Parece que na altura ainda não se pensava em quotas, nem em marginalizados, nem em racismo, nem em xenofobia Não se pensava nem falava, mas era de facto entre eles que Cristo andava, pondo coxos a andar, cegos a ver, leprosos a serem limpos e enviados para o seu ambiente familiar e social. E se palavra havia, era de esperança.
3. Andava com eles e no meio deles, porque com eles Se identificava (O que fizerdes a um destes pequenino, a Mim o fazeis), chegando a afirmar a seu respeito: As raposas têm tocas e as aves do céu têm ninhos, mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça. Vida de cigano, diríamos hoje. Sempre claro (transparência?!) no convite que lhes fazia: Vinde a Mim, todos vós que andais afadigados e abatidos que Eu vos aliviarei. Não punha fardos, coisa em que os fariseus eram exímios, aliviava. Tenho pena que a sociedade não queira ouvir este convite.
A este Senhor peço que tome conta das nossas Sodomas e Gomorras e as desinfete (dói sempre) com a Água Viva que jorra para a Vida Eterna. Porque se não for Ele a edificar a cidade, a degradação moral e a corrupção vão continuar a campear por ai. As vítimas serão sempre os inocentes.
A. da Costa Silva, sj