Quando vamos a um dicionário ver o significado de humildade deparamo-nos com sinónimos como rebaixamento, sentimento de inferioridade e afins. Este é o sentido mundano de humildade. É uma pessoa sozinha que se sente inferior, ou por causas interiores a si própria, ou exteriores a si.
A humildade cristã é diferente. A humildade cristã é o sentimento da necessidade de Deus, o sentimento do nosso nada sem Deus (cinza e pó – Génesis 18, 27). Nesta perspetiva, a humildade eleva-nos até Deus e eleva-nos como pessoas. Eleva-nos como futuros cidadãos do Céu. (“Muitos dos últimos serão os primeiros” – Mateus 19, 30) Outra é a humildade de Jesus.
Em primeiro lugar, Jesus desce do Céu para Se fazer homem. Embora nunca abandonando a sua condição divina, faz-Se homem, mostrando aquela só em raras ocasiões. Como nos diz S. Paulo: “[Cristo] sendo de condição divina ( ), aniquilou-Se a Si mesmo ( ), tornando-Se semelhante aos homens; e, tido pelo aspeto de um homem, humilhou-Se a Si mesmo ” (Filipenses 2, 6-8).
Enquanto homem, Jesus partilha com os homens a necessidade do Pai. (Vemos isso no tempo que Jesus tirava para rezar.) E também partilha com os homens a obediência ao Pai. Em raras ocasiões, apresenta a sua condição divina: no templo, quando diz a seus pais que o seu lugar é na casa do Pai; no batismo e na transfiguração, quando o Pai O glorifica. (“Este é o meu filho amado” – Mateus 3, 17; Mateus 17, 5).
Mas voltemos à humildade dos homens. Esta provem da consciência da necessidade de Deus. Da necessidade de Deus para a salvação e para amar, pois que Deus é Amor e não há amor fora de Deus. (A Igreja prefere chamar caridade ao amor, pois que a palavra amor já está muito deturpada.) Seja como for, a nossa humildade é feita de duas necessidades: a da salvação e a do amor. Ou, se quisermos, a da salvação, que implica o amor.
O amor é o objetivo último da humildade cristã. O amor é aquilo que move o cristão. Porque dizer que a salvação da alma do cristão é aquilo que o move é, de certa forma, um objetivo egocêntrico, um objetivo virado para dentro de si mesmo. Se explicitarmos essa formulação como sendo a prossecução do amor, já essa formulação parece mais aberta.
Concluindo, a humildade cristã, longe de ser um rebaixamento, é um caminho para Deus, é um estado que nos ajuda a caminhar para Deus, porque nos faz perceber a necessidade que temos d’Ele e dos homens. A humildade cristã é particularmente oportuna no seio da nossa sociedade que cultiva a aparência.
Gonçalo Miller Guerra, sj