Desde que Francisco é Papa abundam notícias espetaculares acerca dos seus discursos nas mais variadas circunstâncias. A linguagem e as atitudes do chefe da Igreja Católica vendem de uma forma extraordinária, até mesmo junto dos mais céticos em relação ao Papa e à própria Igreja Católica. Francisco tornou-se mediático. Ou melhor, mediatizado. E aqui reside o problema. Não raramente, os meios de comunicação dizem que o Papa disse o que não disse. Nos casos mais críticos, a Sala de Imprensa da Santa Sé tem vindo a público corrigir a informação propagada nos diferentes meios.
Por exemplo, na primeira audiência geral de 2019, o Papa disse, em italiano: E quante volte noi vediamo lo scandalo di quelle persone che vanno in chiesa e stanno lì tutta la giornata o vanno tutti i giorni e poi vivono odiando gli altri o parlando male della gente. Questo è uno scandalo! Meglio non andare in chiesa: vivi così, come fossi ateo.
A tradução, em português: Quantas vezes vemos o escândalo daquelas pessoas que vão à Igreja e passam lá o dia, ou vão todos os dias, e depois vivem odiando os outros ou falando mal das pessoas. Isto é um escândalo! É melhor não ir à igreja, porque vives como se fosses um ateu.
Em vários jornais, sites e redes sociais, a notícia dada foi: Papa diz que é melhor viver como ateu do que ir à Igreja e odiar os outros.
Estamos perante uma notícia falsa (fake news)? Diria que se trata de uma notícia falsificada pela falta de rigor no acesso às fontes de informação e pela necessidade de sensacionalismo, de audiência. Há especialistas em comunicação que se referem a este tipo de notícias como pós-facto, ou seja, notícias cuja veracidade é presumida por razões de ordem pessoal (convicções religiosas, políticas, culturais ou outras).
Os princípios básicos do jornalismo estão bem afirmados na Lei de Imprensa, a conduta dos jornalistas está bem regulada no código deontológico, mas o atual modelo de negócio dos media, subjugado à publicidade, ao lucro e à agressividade das audiências, está a atentar contra aquilo que é realmente o jornalismo: informar com rigor, verdade e objetividade.
Enquanto houver notícias produzidas a pensar no número de likes que vão gerar e não em função do interesse público que possam ter, estaremos num processo de decadência do jornalismo, com prejuízo evidente para todos, sobretudo num país onde quase não existe educação para os media e a maior parte das pessoas não tem capacidade para perceber quando se trata de entretenimento, sensacionalismo, notícias falsas ou informação e muito menos consegue intervir no sentido de rejeitar esta vaga de informação de baixa qualidade.
Salvar o jornalismo requer cidadãos conscientes e bem informados, que não confundam espetacularização com jornalismo. Salvar o jornalismo implica independência dos órgãos de comunicação face ao poder económico e político. Perante o atual cenário, não é um caminho fácil mas é possível.
Que 2019 seja um ano de melhores notícias!
Elisabete Carvalho