O verão está a chegar. Para muitos é tempo de férias. Mas descansar é muito mais do que uma ocupação que se põe na agenda. É uma atitude. Um estilo. Uma arte.
Não é verdade que, talvez demasiadas vezes, o nosso ritmo de vida é exageradamente apressado, agitado e ansioso? Não nos assemelhamos a uma ambulância, em habitual serviço de urgências, apetrechada de sirene, pedindo a todos que se desviem? A costumada pergunta: Então a tua vida corre bem? não é a constatação de que vivemos mesmo a correr?
Os dias em que tivermos a graça de fazer férias deverão ser um ensaio de um ritmo pacífico, sereno e descontraído, vivido no quotidiano da nossa vida comum, com trabalhos e intervalos, com encontros e momentos a sós.
As férias ideais não são as que se passam numa ilha encantada do Oceano Pacífico, hospedados num hotel de muitas estrelas. A ilha de sonho e o hotel esplendoroso são o nosso coração pacificado e amoroso, dedicado e serviçal. É que as férias começam por dentro. Levamo-nos para férias inteirinhos. Somos a bagagem essencial que dá qualidade às nossas férias. Cada um tem o descanso que é. As circunstâncias ajudam, mas são apenas o complemento do que somos. Importa investir na qualidade do nosso interior, dos nossos afetos, dando espaço a um coração novo e um espírito novo.
Quem quiser ter saúde no corpo, procure tê-la na alma (Francisco Quevedo, 1580-1645). O nosso dentro é a fonte de todo o bem, é a nascente da ordem no amor, da caridade discreta e ordenada. O nosso fora é a fachada que deve corresponder sempre mais ao nosso interior. Também neste contexto, é oportuno recordar o que nos diz Fernando Pessoa: É em nós que é tudo. É ali, ali, que a vida é jovem e o amor sorri.
Recordemos que se quebramos um ovo, a partir de fora, morre um ovo. Mas se um ovo é quebrado a partir de dentro nasce uma nova vida. Um pintainho vem à luz do dia. Há que começar as férias por dentro, renascendo na paz.
Descansar não é abandonarmo-nos à preguiça. Fazer férias não é estacionar no parque da pasmaceira e do marasmo. Não é resignarmo-nos a não fazer nada. Descansar é organizarmo-nos na paz interior, no equilíbrio, na harmoniosa dedicação aos outros. Nesta linha, cito o testemunho da Irmã Sofia que, uma vez encontrando, no Carmelo de Coimbra, a Irmã Lúcia, a vidente de Fátima, lhe fez esta espontânea observação: – A Irmã Lúcia está sem fazer nada! Ao que ela retorquiu: – Eu não estou sem fazer nada. Eu estou a descansar e por isso em seguida poderei trabalhar melhor. Eu estou ocupada a descansar. Ou seja, para a Irmã Lúcia, descansar é uma boa ocupação útil e proveitosa. E para nós, descansar é perder ou empatar o tempo? Ou é ganhar por meio de uma feliz e pacificadora ocupação?
É significativo encontrar, na Bíblia, Deus apresentado como o inventor e o santificador do descanso: Concluída, no sétimo dia, toda a obra que tinha feito, Deus repousou no sétimo dia, de todo o trabalho por Ele realizado. Deus abençoou o sétimo dia e santificou-o, visto ter sido nesse dia que Ele repousou de toda a obra da criação (Ex 2, 2-3). Cristo explicitamente faz a apresentação de Si próprio como fonte de descanso: Vinde a Mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu vos aliviarei… Aprendei de Mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito (Mt 11, 28-29).
Aproveitamos os tempos de oração como repouso no Deus da paz e da consolação? Nesta linha nos recomenda o Papa Francisco: Enquanto nos meses de verão procuraremos um pouco de descanso do que cansa o corpo, não nos esqueçamos de encontrar o verdadeiro alívio no Senhor (2017.07.16). O Padre António Vieira sabiamente nos adverte que o descanso deve ser procurado no lugar certo, no amor que pacifica e anima: A razão por que não achamos o descanso é porque o procuramos onde ele não está. O descanso encontra-se dentro.
Manuel Morujão, sj