fbpx

Encontro Deus no sofrimento?

Como é que se reza a fragilidade? A minha e a dos outros?

Meu Senhor e meu Deus, creio firmemente que estás aqui, no meio destes corredores deste Hospital e que me vês, que me ouves. Muitas vezes eu não te consigo ver, apesar de te procurar silenciosamente no meio dos meus doentes e colegas. É como se fosses uma câmara oculta que nos observa, que nos acompanha em cada corredor. Permanece sempre no seu sítio a gravar. No início, sentimo-nos observados, contudo, com a rotina, esquecemo-nos que existem e que servem para nos protegerem e pedirmos ajuda perante o perigo. Porém, a grande diferença é que não são

apenas umas câmaras. És Tu, Jesus! É Deus que me olha em cada segundo, como um Pai, sempre fielmente presente. Chamas-me a olhar para «Câmaras ocultas e Vivas», e cada uma tem um rosto: doentes, familiares e profissionais deste hospital. Chamas-me a cuidar dos avós, pessoas mais frágeis da sociedade, como Tu fazias ao curar os leprosos e moribundos.

Encontrar-te no meio do sofrimento e da fragilidade humana é um grande mistério, é avassaladora a dimensão sobrenatural que atinge perante a dimensão humana, porque nos damos conta que somos pouca coisa. Este trabalho convida-me a acompanhar-te nas tuas jornadas, a ajudar-te a curar algumas fragilidades do corpo e da alma, a acompanhar-

te no caminho para a Cruz. E é no meio das contrariedades, dos sofrimentos, que me baixas a soberba de que posso levar as coisas para a frente sozinha. Ao tocar esta fragilidade, apercebo-me que és Tu que me procuras. Perante a humilhação, o meu coração move-se a dizer-te: «Senhor, Tu sabes tudo, Tu sabes que te amo!». E a consciência faz-me ver

que muitas vezes estou afogada na quantidade de coisas que tenho de fazer, deixo de «estar no que devo e estar no que faço». Porque estar no que devo implica o esquecimento próprio, ter o coração despojado das minhas preocupações, tarefas, solicitudes constantes que vão surgindo dentro e fora do hospital, dos scrolls reais da minha vida, dos meus cansaços, das minhas opiniões, em vez de estar a olhar para cada doente com esse olhar de compaixão, de caridade, de paciência, etc.

A pressão da sociedade impele-nos a sermos uma sociedade de descarte, como o Papa Francisco nos vai alertando. A verdade é que, no meio destes corredores, o «descarte dos mais frágeis» é tocado e a minha alma sente-se impotente para chegar a todas essas «Câmaras vivas». E Tu vais movendo este coração rebelde, dizendo: «Só mais um» e eu digo: Jesus, ajuda-me a cuidar de mais um, e repete-se a cena, uma, duas… cinquenta vezes. E este trabalho tão humano, Tu fazes que se torne divino. Tu diariamente mostras que o sofrimento pode ser um meio de união e identificação contigo na cruz e que é uma oportunidade para crescer. Ajuda-me a abraçar as pequenas cruzes, os desafios da vida com fé e coragem, lutando por confiar na tua graça. Ao olhar para ti, penso como viveste em paz no meio de tanta dor e sofrimento, mantendo um olhar de

esperança e confiança. Ensinas-me que, com a graça de Deus, podemos acompanhar cada doente. Este é o nosso dever de enfermeiros, o cuidar, o tocar, o consolar, o curar, o acompanhar do primeiro até ao último suspiro… E é mesmo nestes momentos que te fazes ouvir com mais força, no meio dos meus sofrimentos e dos meus silêncios. Um silêncio que move o meu coração.

Move-me ao ouvir estas «Câmaras ocultas vivas» a dizer: «Enfermeira, tenho sede!». Temos a sorte de te podermos tocar, limpar o teu rosto, como fez aquela mulher, mas precisamos de lembretes interiores. «A Jesus basta-lhe um sorriso, uma palavra, um gesto, um pouco de amor». E tal como Jesus, muitos doentes são «desprezados, rejeitados, menosprezados, considerados em nada», apenas um número de uma cama ou processo clínico e apenas posso, muitas vezes, oferecer-te uma medicação, um tratamento às tuas feridas, um copo de água, pedir o atendimento sacerdotal, uma mão… mas é tão pouco. E o dar-te de beber, através de cada doente, faz com que me sinta mais próxima de ti.

Mariana Guimarães

(In Mensageiro do Coração de Jesus, julho de 2024)

Atualidade

Meditação Diária

Seleccione um ponto de entrega