No que diz respeito ao medo da morte, não existem soluções fáceis: não basta, por exemplo, impor a si mesmo não pensar nisso. Não conheço um método melhor do que aquele de se concentrar no presente. Assim se pode actualizar também o modo como Cristo venceu a morte, oferecendo-Se todo a Deus Pai. Mesmo morrendo de uma morte injusta e cruel, disse: «Pai, nas tuas mãos, entrego o meu Espírito».
Este é o segredo! Se não nos confiamos a Deus como crianças, deixando que Ele providencie o nosso futuro, nunca chegaremos a cumprir aquele gesto de total abandono de si mesmo, que constitui o núcleo da fé. Certamente, iremos rever aqueles que amámos. Também aqueles que amaram mesmo não tendo conhecido Jesus. Como escreve Dante, «a bondade divina tem uns braços tão grandes que toma aquilo que a ela se dirige».
Mas de onde vem uma fé assim dócil? É um dom de Deus. Mas isso não significa que não somos chamados a fazer tudo o que está ao nosso alcance para receber este dom. Que a ausência prolongada de uma pessoa muito querida gere solidão, isso é algo que deve ser entendido e respeitado. Não é difícil na nossa vida experimentar momentos dramáticos, por ocasião da morte de um parente próximo ou de um amigo querido.
«Gostaria de ter a sua certeza sobre a existência de Deus; mas infelizmente não é assim»: sinto muito a fragilidade desta minha fé e o perigo de a perder. Por isso peço muito ao Senhor e entrego-Lhe a minha vida, a minha morte e todos aqueles que chegam ao momento da morte com pouca confiança no poder de Deus.
Excerto retirado do livro de Carlo M. Martini, Falar com o Coração, Editorial AO 2014