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Desestatizar a educação

Perante o presente assédio ideológico do Ministério da Educação ao serviço público de educação prestado por escolas/colégios com contrato de associação, ocorre-me fazer algumas breves observações.

Assim afirma o artigo 43.º da Constituição da República Portuguesa: «É garantida a liberdade de aprender e ensinar». «O Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer diretrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas». Portanto, a lei fundamental do nosso País proíbe que o Estado se arvore em educador do povo, como acontece em países governados por ditaduras de esquerda ou de direita.

O direito, e consequente dever, de educar pertence aos pais, como recorda o artigo 26.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem: «Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o género de educação a dar aos filhos». Na mesma linha, afirma o n.º 3 do artigo 14.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia: «São respeitados (…) o direito dos pais de assegurarem a educação e o ensino dos filhos de acordo com as suas convicções religiosas, filosóficas e pedagógicas». Ao direito dos pais escolherem o tipo de educação que querem para [os] seus filhos corresponde o dever do Estado de respeitar e viabilizar na prática tal direito.

Dir-se-á que em Portugal se cumpre à risca este direito dos pais escolherem o tipo de educação que desejam dar aos seus filhos. Alexandra Leitão, Secretária de Estado, que confessou ser a autora ideológica da norma que corta os contratos de associação, confessou também que escolheu, «por acaso» (há acasos absolutamente intencionais), pôr os seus filhos no Colégio Alemão, em Lisboa, escola particular fora da rede pública de educação, onde os pais devem pagar elevadas propinas. Um justo exercício de liberdade, mas que não é uma carta de recomendação da qualidade das escolas estatais.

Simplesmente importa notar que o exercício deste direito fica bem caro aos pais. É o livre exercício de um direito reservado aos ricos, ou dito mais diplomaticamente, aos que têm uma boa base financeira. Negar o mesmo direito aos de escassos recursos, ou dizendo o mesmo menos diplomaticamente, aos pobres, é uma injustiça que brada aos céus. A liberdade não é um direito que se compra, mas é um dever concedê-la a todos, sem qualquer distinção.

Quão longe estamos em Portugal de os pais poderem, na prática, exercitar o direito constitucional de escolherem o tipo de educação que desejam proporcionar aos filhos! O serviço público de ensino proporcionado por escolas/colégios particulares com contrato de associação é uma feliz pequena ilha (menos de 0,3%) de liberdade real, no mar de estatização do ensino ou da opção de ir para as alternativas caras do ensino particular, para quem tem capacidade financeira de o fazer. É esta pequena ilha de liberdade real que o Ministério da Educação decidiu cortar substancialmente, de modo desajeitado e prepotente, negando-se ao diálogo e rasgando os contratos assinados um ano antes com a duração de três anos. Em todo o lado custa deparar-nos com a falta de educação, mas muito mais quando se trata da casa onde deveria habitar como sua residência oficial.

Nos tempos da velha senhora, a tentação de estatizar o ensino era igual ou ainda maior. Mas tratou-se de uma quarentena de anos de ditadura do velho Estado novo, com pensamento absolutista e cartilha única. Vivemos felizmente em democracia, que não pode ficar encaixilhada no nome e congelada em palavras ocas, mas que tem de descer às realidades concretas, especialmente no campo da educação. Se é intolerável o estatismo de direita, controlador e despótico, não o é menos o estatismo de esquerda. O estado e o governo são para as pessoas e não as pessoas para o estado e o governo.

Importa democratizar a democracia. Urge libertar a liberdade também no campo da educação. Há que libertar o direito, ainda cativo, de os pais poderem, na prática, escolher a educação que querem proporcionar aos seus filhos.

 

Manuel Morujão, sj

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