No início deste mês de outubro, o Papa Francisco fez uma visita apostólica ao Azerbaijão. Este é um pequeno país com cerca de nove milhões de habitantes e com uma presença cristã claramente minoritária. Estima-se que os católicos sejam apenas uns seiscentos ou setecentos. Isso mesmo: menos de 700 pessoas! O correspondente a uma pequena paróquia em Portugal.
Facilmente podemos pensar: «mas não deveria o Papa Francisco dedicar mais tempo a outros locais com mais cristãos que o querem ver? Em maio, de certeza que estarão centenas de milhar de pessoas em Fátima para o verem!». Prevendo estas críticas, em Baku, no Azerbaijão, quando terminava a Eucaristia, o Papa Francisco disse: Alguém pode pensar que o Papa perde tanto tempo (…) para visitar uma pequena comunidade de 700 pessoas (…). É uma comunidade de periferia. Mas o Papa nisto imita o Espírito Santo, Ele que desceu do Céu numa pequena comunidade fechada no cenáculo. Aquela comunidade (…) sentia-se pobre, isolada, (…) e Ele dá-lhe a força para continuar e ir para a frente a proclamar o nome de Deus. E as portas daquela comunidade de Jerusalém, que estavam fechadas, pelo medo, pela vergonha… abrem-se e sai a força do Espírito. O Papa perde o tempo como o perdeu o Espírito Santo. Só duas coisas são necessárias: naquela comunidade estava a Mãe. Não esquecer a Mãe. Naquela comunidade havia a caridade, o amor fraterno que o Espírito Santo versou sobre Eles. Coragem. Para a frente. Sem medo. Para a frente»*.
Desde o início do seu pontificado que o Papa Francisco nos tem desafiado a irmos às «periferias» e ele tem feito isso mesmo. Nas suas viagens não se deixa fascinar pelos números, mas quer ir ao encontro das pessoas onde elas estão. Por isso fura os protocolos e entra em bairros carenciados, onde não estava prevista uma visita, ou manda parar o «Papamóvel» para saudar uma pessoa no seu caminho.
Se calhar, segundo a nossa lógica, faria mais sentido que o Papa, uma vez que vem a Fátima em maio, também visitasse Lisboa ou o Porto, onde teria, sem dúvida, um mar de gente que o receberia, em vez de perder tempo no Azerbaijão. O Papa Francisco sabe que a Igreja é um corpo, não uma mera associação de pessoas. Ele bem sabe que somos todos parte do mesmo corpo e que todos temos a ganhar quando o corpo está bem.
Naquela pequena comunidade do Azerbaijão, os nossos irmãos sentem-se sozinhos e isolados. O Papa Francisco sabe que eles precisam muito de incentivo e de oração. Precisam sentir que fazem parte de um corpo de irmãos e irmãs. É exatamente isto que o Papa foi lá fazer: para lhes dizer que somos irmãos! Somos corpo de Cristo!
A coragem do Papa em «perder tempo» com umas poucas centenas de pessoas quando, em Roma, sem sequer sair de sua casa, teria muito mais gente para o escutar, mostra-nos o quanto é importante que nos recordemos que em Cristo somo um só corpo. De nada nos serve a «nossa fé» se esta não nos fizer sintonizar com todos os batizados de todo o mundo. Esta viagem e o aparente desperdício do pouco tempo do Papa recorda-nos que a relação com Deus não é uma coisa individual, só minha, mas que a intimidade da relação pessoal com o Senhor existe enquanto sou parte de um corpo, o corpo místico de Cristo.
Marco Cunha, sj
Nota: Podemos ver o vídeo com as suas palavras aqui: https://www.youtube.com/watch?v=d-jaxGCewyg