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Hino à inteligência natural criadora da inteligência artificial

Quem, usando a sua natural inteligência, não se maravilha perante os progressos tecnológicos, nomeadamente no campo da inteligência artificial?

Mas este novo mundo que nos deslumbra não é fruto do acaso, ou inventado por génios pós-humanos que aterraram no nosso planeta, vindos de outra galáxia. Ao volante da “máquina” da inteligência artificial está o seu inventor humano com as extraordinárias capacidades da inteligência natural. Estamos habituados a usar “máquinas”, tão simples quanto sofisticadas, como o computador ou o telemóvel. O autor bíblico, alguns séculos antes de Cristo, louva a Deus que concedeu ao homem “sabedoria, inteligência e capacidade para toda a espécie de trabalho” (Ex 35, 31).

Estamos tão habituados a usar a nossa natural inteligência que nos falta tempo e vagar para nos maravilharmos com a alta “tecnologia” de um raciocínio que nos leva a tirar conclusões certas de um emaranhado de informações. O “depósito” da memória fornece os dados que precisamos para tomar decisões, ajudados pelas “asas” da imaginação que nos fazem voar pelas alturas da criatividade. A nossa inteligência é um “farol” de luz que nos permite ler o que está para além da superfície; é uma leitura do que está por dentro (intus-leggere). Como recorda o poeta: “Ver só com os olhos / é fácil e vão. / Por dentro das coisas / é que as coisas são” (Carlos Queiroz). A inteligência natural está ligada a um “mecanismo digital”, vulgarmente chamado mãos. Escrevem prosa e poesia, abraçam e amparam, pintam e esculpem inventando obras de arte que nos deixam em estado de admiração permanente. A inteligência natural tem ligação direta à tecnologia da voz, que sabiamente fala e belamente canta. Todos estes mecanismos estão ligados à “balança” da consciência moral, que pesa o que vale e o que não presta, ponderando o bem e o mal, o poder e o dever, a verdade e a beleza e seus contrários.

Somos uma obra de arte perfeitíssima, com uma inteligência criativa, que nos últimos tempos gerou a inteligência artificial, cujo poder e alcance parecem ilimitados. Assim, o autor da Carta aos Hebreus enaltece o Criador perante a maravilha que é o homem: “Fizeste-o um pouco inferior aos anjos, coroaste-o de honra e de glória, submeteste tudo a seus pés!” (Heb 2, 7-8).

Os maravilhosamente espantosos progressos tecnológicos não se podem endeusar, qual novo “bezerro de ouro” que merece adoração (cf. Ex 32). Assim observa o Papa Francisco na sua recente Mensagem para o próximo Dia Mundial das Comunicações Sociais: “É certo que as máquinas têm uma capacidade imensamente maior que os seres humanos de memorizar os dados e relacioná-los entre si, mas compete ao homem, e só a ele, descodificar o seu sentido. Não se trata, pois, de exigir das máquinas que pareçam humanas; mas de despertar o homem da hipnose em que cai devido ao seu delírio de omnipotência, crendo-se sujeito totalmente autónomo e autorreferencial, separado de toda a ligação social e esquecido da sua condição de criatura”.

Todos os tipos e realizações da inteligência artificial têm de ser governados e orientados pela inteligência natural, que não se pode apartar de critérios de avaliação ética, porque o poder não significa dever, não comporta um direito. Baste um simples exemplo: um drone tanto pode servir para levar medicamentos urgentes para tratar um doente, como para transportar bombas a fim de matar indiscriminadamente. Assim nos recorda o Papa no documento citado: “É importante ter a possibilidade de perceber, compreender e regulamentar instrumentos que, em mãos erradas, poderiam abrir cenários negativos. Os algoritmos, como tudo o mais que sai da mente e das mãos do homem, não são neutros. Por isso é necessário prevenir propondo modelos de regulamentação ética para contornar os efeitos danosos, discriminadores e socialmente injustos dos sistemas de inteligência artificial e contrastar a sua utilização para a redução do pluralismo, a polarização da opinião pública ou a construção do pensamento único”.

Importa ser humanamente inteligentes no uso da inteligência artificial. A maravilha dos progressos tecnológicos deve ser sempre acompanhada de valores, de humanismo ético. Parafraseando um dito de Cristo, a tecnologia foi feita para o homem e não o homem para a tecnologia.

Manuel Morujão, sj 

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