De uma forma voluntária, organizou-se com outros colegas e partiram dispostos a ajudar. Choveu sempre e, por isso, as fotografias têm a cor de um céu cinzento e quase cheiram a terra molhada. A primeira mostra uma mãe e um filho, protegidos com capas de plástico azuis. Nenhum deles fixa a câmara. O rapazinho, sentado em cima de um pneu, abre os braços e sorri. Pouco. A mãe, sentada num cobertor, tem a cabeça tapada, uma manta nos ombros e um peluche caído ao seu lado. À sua volta estão garrafas vazias, sacos de plástico, galhos e folhas e há lama por todo o lado.
Noutra fotografia, aparece uma tenda grande e aberta. A lama é a mesma, tal como os sacos de plástico, os cobertores atirados para cima da tenda, o lixo. Alguns caixotes de cartão lembram-nos as marcas que inundam os supermercados de uma Europa que vive na abundância dos excedentes. Uma Europa que vive tão longe destas fronteiras.
Na terceira fotografia, um grupo de homens, abraçados, regista o fim de uma manhã de trabalho. Todos estão protegidos da chuva pelas mesmas capas, alguns com grandes pás. Percebemos que abriram caminhos, limparam estradas, apanharam lixo. A pele branca de uns contrasta com barbas escuras de outros. O sorriso de alguns não faz esquecer os semblantes pesados de outros… e mesmo quando se percebe que, no meio de toda aquela tragédia, se tocou música com instrumentos tradicionais, permanece a mesma tristeza que tapa quaisquer sinais de esperança.
A fuga de refugiados pelas fronteiras da Europa é um drama real, umas vezes levado ao palco dos grandes acontecimentos, outras vezes ignorado porque interessa, ou porque já não interessa. Mas sempre que volto a olhar para aquela mãe e aquele filho, só consigo pensar em Belém, na gruta do grande milagre. A pobreza é a mesma, discreta e humilde. A maternidade é a mesma, que não conhece tempo, nem lugar. A ternura é a mesma, naquele menino, tapado por plásticos, sentado num pneu abandonado, de braços estendidos. E a sua mãe não resiste a um ligeiro sorriso… talvez por ver que o seu filho mereceu a atenção daquele estrangeiro, vindo de longe para o fotografar. Agora, já terá chegado a neve e o frio àqueles caminhos enlameados. Que será feito deles?…
Isabel Figueiredo
(in Mensageiro – Dezembro 2015)