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O mundo da cegueira e a cegueira do mundo

1. Como em tudo na vida há quem veja, há quem não veja, há quem queira ver e há quem não precise de ver porque está convencido que já vê. Muito deambulou Cristo no seu ministério público pelo mundo dos pobres, dos coxos e aleijados e, como não podia deixar de ser, pelo mundo da cegueira, a começar pela dos fariseus a quem se atreveu a chamar “Cegos a conduzir outros cegos” que viam ao longe, mas não viam ao perto. Viam os argueiros no olho dos outros e não viam a trave no seu. Muita miopia e dupla imagem, conforme se veem a si ou veem os outros. Estamos no campo dos fanatismos, alguns a raiar a “cegueira” do ódio, e das miopias que o tempo chuvoso e nebulado de inverno agrava ainda mais.

2. Os tempos que correm (está na moda) são de ataques torpes à Igreja, de notícias desonestamente lançadas, de generalizações intencionais a partir de casos concretos, para não falar da linguagem “baixa” e insultuosa em meios de comunicação social, nomeadamente nas redes sociais onde abundam, para o efeito, bloguistas cobertos pelo anonimato. Sinto-me revoltado com tanta desonestidade intelectual e com o tom inquisitorial dos proclamados defensores do laicismo, os mesmos que não se coíbem de constantemente condenar a Igreja com a lembrança da Inquisição.

3. Seja como for, é neste mundo e neste tempo que temos de viver como seguidores de Jesus em que a missão de curar “cegueiras” me parece pertinente, a começar pelas nossas. Penso no cego Bartimeu (Mc 10, 46-52), sentado “à beira do caminho” onde Jesus ia a passar; aquele grito (“Começou a gritar”) mostra bem o desejo de querer ver e viu mesmo; ele queria entrar no caminho onde caminha a multidão e não continuar “um excluído” a pedir esmola de mão estendida e “por favor”. E, por isso, “saltou” para esse caminho ao ser curado por Jesus. Agora é mais “um incluído” no meio daquela multidão a seguir com os seus concidadãos para a celebração da Festa da Páscoa em Jerusalém. Bartimeu não estava apenas sem vista, estava também perto, embora (“à beira”), sem o caminho onde andam os homens e onde andava e anda Aquele que dissera “Eu sou o Caminho”. E começou a segui-Lo rumo à cidade onde a vida acontece e a esperança de vida nova o chama. Vai novo “homem”, seguindo Jesus a caminho do homem “novo”. E no caminho dos homens encontrou o seu caminho e o de Deus.

4. Temos ainda o relato da cura de outro cego (este sem nome) que também merece reflexão. Aqui é uma cura feita a dois tempos: primeiro começou a ver os homens como “árvores ambulantes”, sendo precisa uma segunda intervenção do Senhor para que começasse a ver realmente “pessoas” e não “objetos”. Estou em crer que o mundo dos fanatismos e divisões entre esquerdas e direitas, ditaduras e democracias, capitalismos e socialismos, elites e povo, ricos e pobres, poderiam pelo menos ser atenuados. Bastava para isso que nos víssemos como pessoas e não como objetos, com os mesmos direitos e deveres, com as mesmas necessidades e oportunidades de realização pessoal e vida em comum. E se nos conseguíssemos ver como “irmãos” dum mesmo Pai que espera por todos nós, tanto melhor. Seria “ouro sobre azul” numa paisagem mais serena e pacífica, e certamente mais justa.

 

A. da Costa Silva, sj

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