Santo Agostinho dizia que “ninguém ama aquilo que não conhece, o que se aplica na perfeição à atitude que temos para com as pessoas com deficiência. Como não se enquadram nos instituídos padrões de beleza e de sucesso, são facilmente ignoradas, repudiadas e até escondidas, muitas vezes pelas próprias famílias.
Há pessoas deficientes com histórias de vida terríveis, que vivem ou viveram em condições miseráveis, mas que, mesmo assim, são capazes das maiores lições de amor. Para não falar da gratidão com que tratam quem lhes quer bem.
Conto-vos a história do Paulo. Tem 39 anos e é deficiente mental. Ficou órfão de mãe aos 10 anos. Foi viver com uma família de acolhimento. A irmã, deficiente profunda, foi entregue a uma outra família de acolhimento. Moravam próximos. O Paulo via a irmã sempre que queria. Até que um dia a irmã foi institucionalizada bem longe da aldeia onde nasceram e cresceram. Já lá vão mais de 15 anos e ainda hoje o Paulo continua regularmente a bater à porta para saber da irmã, porque, diz ele, «ela é minha irmã e eu quero saber dela».
Mas também há lições de amor naquelas famílias que muitas vezes se nos apresentam como disfuncionais e negligentes. Lembro-me, por exemplo, de um outro Paulo que vivia sozinho com a mãe, trancado dias e dias num quarto de uma casa em ruínas, com um cão feroz à porta. A mãe recolhia cartão nas feiras para vender e assim conseguir um sustento. O Paulo reunia condições para ir à escola e viver integrado, mas apenas saía de vez em quando para as feiras. A situação considerada de risco estava identificada pelas entidades competentes e no dia em que o Tribunal ordenou a retirada do menor à mãe, a instituição acolhedora decidiu não o fazer e explicou as razões: havia uma relação muito forte entre a mãe e o Paulo. Era desumano separá-los. A única riqueza daquela mãe era o filho e para o proteger e «defender dos outros» mantinha-o trancado em casa. Uma estranha forma de amor, mas que não podia ser descartada. Aquela mãe só precisava de ajuda e de condições para viver com dignidade e sem medo.
Medo e falta de condições materiais e espirituais é o que leva muitas famílias a fazerem com que os seus deficientes se tornem invisíveis. Muitas escondem para proteger, maltratam porque não conhecem outras formas de lidar com a agressividade e outras manifestações da doença, têm vergonha de pedir ajuda, vivem desgastadas, não sabem a quem recorrer e, na verdade, há casos para os quais o Estado e a sociedade não têm resposta.
Estas famílias, algumas verdadeiramente heróicas, precisam essencialmente de compreensão, solidariedade e apoio. Assim como os seus deficientes, que, apesar das crises e limitações, são pessoas ternas, de sorriso fácil e de abraço imediato.
Na celebração do Jubileu dos Doentes e das Pessoas com Deficiência, o Papa afirmou que é necessário aceitar a limitação e o sofrimento para compreender «o verdadeiro sentido da vida».
Francisco sustentou que «o mundo não se torna melhor quando se compõe apenas de pessoas aparentemente perfeitas (para não dizer maquilhadas), mas quando crescem a solidariedade, a mútua aceitação e o respeito entre os seres humanos».
Na ocasião, o Papa propôs «a terapia do sorriso» e disse que «a felicidade que cada um deseja pode exprimir-se de muitos modos, mas só é possível alcançá-la se se for capaz de amar».
Em vez de ignorar, lamentar, experimentemos conhecer a riqueza de sentimentos das pessoas com deficiência e descobriremos um mundo de afetos, onde a felicidade existe.
Elisabete Carvalho