Neste mês de maio, parece que o mundo à nossa volta se centra em Fátima. É surpreendente o número de peregrinos que vêm a pé a caminho do Santuário, de Portugal inteiro. Este ano calcularam que pelo menos 36 mil pessoas caminharam como peregrinos a pé para Fátima. Eu meti-me nesta maravilhosa odisseia. Estou solidário e em comunhão com muitos, com todos os que fazem esta aventura de amor.
Já há dezoito anos que acompanho, quase todo o tempo e fazendo o percurso a pé, de Lisboa a Fátima, uma peregrinação de muitos peregrinos. Este ano éramos 240 e, além da chuva, sentimos bem a graça que ia caindo do Céu sobre nós. Tive a alegria de ter, nalguns dias, alguns sacerdotes que vieram ajudar a atender as pessoas e a confessar, a celebrar o sacramento da alegria do perdão.
Com mais de duzentas pessoas é preciso uma logística e uma preparação que alguns responsáveis fazem com muito carinho, amor e dedicação. Tudo está calculado e preparado; desde as refeições, as dormidas, o itinerário, as paragens para descanso. Eu sou padre mas também peregrino e parece que Nossa Senhora me pega ao colo e nem sequer me deixa ter uma bolha ou doer muito os músculos. O mais importante, porém, é a missão de ajudar e apoiar espiritualmente aquele rebanho de 240 pessoas. Mas Deus ajuda e Ele mesmo faz maravilhas, verdadeiros milagres da graça.
O caminho é diversificado. Retas enormes, algumas com mais de seis quilómetros, subidas duras e que nos obrigam a puxar pelos músculos, paisagens belas, como a planície cheia de videiras já com muitas folhas. Campos e cidades, vistas soberbas que nos fazem desfrutar a beleza de Deus através da natureza. Pequenas aldeias onde os habitantes nos saúdam com carinho e nos pedem que em Fátima rezemos por eles. Tudo nos ajuda a tentar encontrar Deus em tudo e tudo em Deus.
Depois do pequeno almoço, há um momento de reflexão para dar a todos uma pequena ajuda espiritual para o dia, explicando a intenção pela qual queremos centrar nossas súplicas e a virtude que queremos pedir e viver. É o pontapé de saída. Muitos, só ou em grupo, começam a rezar ou a cantar terços, às vezes muitos, até ao fim do dia. E é assim, um dia após outro. Tanta oração vai dando muito fruto. Deus vai fazendo seu caminho dentro de cada um e Nossa Senhora vai ajudando.
Cada dia temos o momento alto, o melhor de todos, na celebração da Eucaristia, em que não falta a ajuda e o entusiasmo do coro e de cânticos que nos elevam. Há também caminhadas em que todos guardamos silêncio e caminhamos em oração, reflexão, contemplação. Há muito diálogo, partilha de vida e de experiência. Somos uma verdadeira família que vai caminhando e fazendo um Retiro espiritual de Lisboa a Fátima. Há lágrimas de alegria e conversão. Há dom da graça que leva muitos a converterem-se, pois já não se confessavam há muitos anos. Alguns dizem que nem sabiam rezar o terço, mas acompanhados e ajudados lá começam e, nos últimos dias, já rezam cinco, seis ou mais, de manhã à noite. Muita oração, alguma penitência, muitas conversões. Muita experiência do amor de Deus, muitos desejos de vida mais santa. Nossa Senhora vai ajudando. Tudo é graça.
E eu, como peregrino que caminha a pé com aquele grupo maravilhoso, alguns com pouca fé, outros sem serem casados pela Igreja, mas querendo com Maria, a Mãe, caminhar para Jesus, lá vou atendendo e confessando o dia inteiro. Que maravilha. Quantas iluminações de Deus, quanta força do Espírito, quanta proteção de Nossa Senhora. E tudo bem programado e preparado por uma equipa organizadora, com carro de apoio, com momentos de alegre partilha, com especialistas que cuidam das bolhas, das feridas, dos mais cansados ou abatidos. Cresce a amizade, a família de peregrinos, a intimidade, a ajuda entre todos, a atenção aos que se feriram, aos que se sentem mais tristes, aos que precisam de mais apoio.
Tenho a oportunidade de fazer alguma alocução sobre temas da vida, da fé, da espiritualidade. Quase a chegar a Fátima, na longa reta de Minde, lá brota o último sermão: 1º – A peregrinação começa amanhã, na vida de casa, de escola, de emprego: aí vamos viver o que aqui ouvimos e rezámos, viver a sério nossos compromissos com a Mãe. 2º – Rezar o terço todos os dias. Não basta ter aqui rezado dezenas durante estes seis dias. 3º – Uma vida sacramental cuidada, com Missa dominical e confissão frequente, para os frutos da peregrinação continuarem vivos e fecundos. 4º – Reunião todos os dias 13 de cada mês para nos vermos e rezarmos juntos, para soprar as brasas e deixar incendiar os corações.
No final das cerimónias em Fátima temos uma reunião de avaliação, de partilha das experiências espirituais. Quantas graças, quantas maravilhas. Quantos dons. Partimos com o coração e a alma cheios. Bendito seja Deus. E ficamos a desejar voltar para o ano. E pensamos que muitos padres podiam ajudar grupos de peregrinos a fazer uma verdadeira peregrinação. Que as paróquias se deviam movimentar para ter esta bela e frutuosa experiência com o seu pastor.
Dário Pedroso, sj